domingo, 29 de novembro de 2020

Em direção ao encontro

As vezes parece 
Que os gestos doces são solitários 

Uma coisa que fazemos 
Para sermos fiéis a nós mesmos
Para sermos auto indulgentes 
Algo que está para além da nossa vontade de se encaixar 
São coisas que sentimos 
Que precisamos fazer 

Até quando 
Andando cabisbaixos 
De repente 
Esbarramos com alguém 
A quem podemos olhar nos olhos 
Sermos nós mesmos 
Enquanto estamos juntos  
O fogo reacende! 
Os olhos voltam a brilhar!
E uma nova história linda 
Fica tão perto quanto um sim

As vezes parece 
Que os gestos doces são solitários 
Mas estamos sempre indo ao encontro de nós mesmos 
Um no outro
 

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Eu tô nessa varanda na Itália
Cercado de flores 
Ouvindo música 
E olhando as casinhas do outro lado do vale 
Como pequenas cabeças de alfinete

Dentro delas 
Existem pessoinhas 
Que acham que suas preocupações são grandes
Como eu aqui acho que são as minhas 

E somos todos tão pequenininhos 
E o tempo corre estranho 
Uma hora voa 
Outra hora se arrasta 

E o meu sentindo
Preso aqui comigo 
Viaja continentes e cruza oceanos
Pra te imaginar dançando 

E na minha ilusão de ser 
Esse sentimento perene 
Parece tão grande, tão justo, tão bonito 

Acho que a gente só existe mesmo na minha imaginação 
Mas que mitologia tocante 
Que deusa bonita você é 
Que suspiro apaixonado 
Que amor melancólico

Eu tento me inclinar pro futuro 
E ver a gente junto 
Mas que bobeira 
Mas que bobeira importante
Pelo menos pra mim 

sábado, 21 de novembro de 2020

Fogareiros queimavam em grandes caldeiras de bronze, fazendo-as reluzir com um brilho dourado ao redor do salão. Pelas persianas o oceano de areia azul, iluminado por todas as estrelas, de onde vinha sibilando o vento fresco do deserto noturno. Enquanto ali dentro na luz dourada do fogo, luziam o rosa, o verde, o azul e o vermelho, das almofadas de cetim. Na tapeçaria intrincada, um grupo de amigos se esparramava. Bandejas de prata trabalhada, com jarras de metal traziam os licores mais exóticos, como exótica também era a fumaça que bruxuleava dos narguilés. Ali os homens de olhos pintados, barbas untadas, turbantes magníficos! Discutiam astrologia, matemática, medicina - entre orgias maravilhosas com odaliscas lubrificadas e entre opióides que os levavam às estrelas. Oh quanto sabiam, quão bem viviam, quanto conquistaram; homens da Babilônia e de Persépolis. Não foi senão a inveja dos bárbaros que os empurrou ao esquecimento. Mas nas areias do tempo ainda vivem em sonhos clandestinos. 

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Desassossego

Em seu leito de morte 
Entre bips e muitos aparelhos 
Você agarraria talvez 
O médico pelo colarinho 
Implorando 
"Só mais um dia"

Mas quantos dias você joga fora 
Hoje? 
Ou a que deus devota seus dias com diligência? 
E o que é afinal 
A vida 
E o que é viver? 

Como poderíamos
Se é que existimos at all 
Achar que temos escolhas? 

Eu por exemplo
Nasci assim sofrendo de várias anomalias 
Uma delas é a melancolia 
Outra a profundidade 
Ser esquisito talvez estivesse no meu DNA
E eu já tentei me encaixar 
Não dá

O que fez de mim uma criança quieta 
Que olhava de soslaio e se dedicava muito a entender do que os adultos estavam falando? 
Que achava as outras crianças chatas 
Que se entertia mais com livros que com videogames? 

Foram meus pais? Foi a necessidade de obter reconhecimento das pessoas? Como talvez seja o objetivo mal disfarçado desse texto.
E quem fez meus pais serem como meus pais e quem fez os pais deles? E quem determinou o que seria motivo de vaidade?

Eu sou atravessado por esse turbilhão de informações
desde as longas cadeias proteicas que determinam minha fisiologia
Até essas interações todas que permeam o oceano agitado de uma sociedade 

E eu fico pensando
Como pode alguém passar despercebido por isso tudo? 
E como poderia alguém se perder nessa realidade esmagadora sem ser devorado pela insanidade?

Seria possível, quem sabe um dia, algum supercomputador calcular todas essa vertiginosa multitude de informações e saber talvez, o que é a vida? Prevendo assim o futuro? Se o Universo é um fenômeno no tempo e se fora do tempo ele já é consumado, não seria ele mesmo esse supercomputador já que o Universo não sabe o que acontece num sentido de consciência, mas de que ele calcula o resultado de cada equação, dando aos acontecimentos sua sequência lógica?  

Seria possível mapear todas as conexões 
Desde cada braço de cada neorônio 
A composição química de cada hormônio
O motivador de cada ação 
E a infinita cadeia de reações? 

Seria possível talvez 
Se erguer em transcendência 
Pra fora do Universo 
Segurar suas galáxias todas nas mãos
Como elas são, foram e serão
Como se essa expansão caleidoscópica 
Fosse o universo
um fato consumado 
E chamar a si mesmo 
Deus 

E dotar tudo de um sentido transcendental 
Dando a essas efemeridades que chamamos homens 
Uma alma ETERNA
Através da qual poderiam preservar eternamente sua individualidade tão contraditória e insignificante.
E fazendo com eles uma aliança num deserto onde uma tribo se saberia escolhida como filha favorita 
Dessa fucking entidade cósmica
Onde só o indivíduo A e B seriam os detentores da última verdade e por isso fossem colocados acima de todos os outros primatas e da natureza toda como Verdadeiros Escolhidos do Pai Celestial?

Não seria mais provável acreditar que essa seria uma mentira que esses animaizinhos sedentos de poder que chamamos Homem, cumprindo suas determinações biológicas e sociais, teriam inventado essa história pra se sobrepor aos outros primatas e natureza toda? 

Mas como levar a vida sabendo que nossa consciência e individualidade é uma farsa
Que a evolução nos deu uma inteligência pra aumentar nossas chances de sobrevivência - objetivo de todo ser vivo - mas que essa mesma inteligência nos dá essa auto percepção de que somos animaizinhos duelando pra preservar a nossa espécie nessa poerinha que chamamos planeta Terra. 

Como seria aterradora então a percepção de que não somos especiais, de que estamos sozinhos no frio e que ninguém trará o cobertor. De que não vamos rever as pessoas que perdemos. De que não haverá justiça transcendente pra julgar os abomináveis atos de crueldade!

Eu não acredito em Deus 
Eu não acredito em Deus porque não posso acreditar 
Deus é do tamanho do nosso vazio
Do tamanho da nossa dor, do nosso medo
Deus é uma desculpa que nos inventamos pra poder continuar 

E pra falar a verdade eu não acredito no homem também

Essas são duas verdades aterradoras 
Deus não existe 
Mas o indivíduo também não existe 
Eu que escrevo não existo e você que lê também não 

Segure minha mão e me acompanhe nesse passeio 

Desde o primeiro ser vivo
gestado na lama morna dos oceanos primordiais sob pressão esmagadora e temperaturas extremas 
Existe uma linha de carbono que se extende do passado remoto até o futuro imprevisível 
E nessa linha você é um ponto 
Carregado de todas essas existências remotas 
Seus instintos 
seus impulsos inomináveis 
Composto dessas moléculas pesadas fundidas em estrelas distantes 
Como esse aglomerado de átomos 
Que precisa repor seus elementos químicos 
E precisa seguir seus instintos primordiais 
É também atravessada por elementos sociais que mal compreende 
Desde a natureza intrínseca da linguagem em que foi alfabetizado 
O formato de família e religião através do qual aprendeu a olhar o mundo e essas relações todas que naturalizamos 
como país, dinheiro, tecnologia... 
Como você não poderia se considerar o resultado dessa cadeia de eventos arranjada muito muito antes de você nascer e disposta no infinito como ato já consumado? 
Como você poderia olhar esse pedaço efêmero de carne no espelho e considerando o intrínseco arranjo da sua biologia, considerando essa troca constante de átomos com o entorno arranjados sempre em um padrão fluído em mutação e pensar, considerar essa pressão esmagadora da história sobre esse pedacinho da sociedade que você chama de você e pensar: 
"eu sou"
?

Quão gigantesca seria a epopéia de segurar as cordas da vela e navegar o Oceano tempestuoso do espaço-tempo achando que tem o leme nas mãos e o mapa mais preciso sobre a mesa? 
Tomar o cavalo indomável do Universos pela crina se considerando senhor de si! Cavaleiro do Universo 

Se considerando uma entidade detentora de originalidade, individualidade, livre arbítrio!!! 

Ou não seria mais seguro supor 
Que como essa realidade toda 
Psicodélica 
Sobrecarregante em sua complexidade 
E humilhante na percepção da nossa natureza tão insignificante e efêmera
Não pode ser enfrentada de frente 
Sem sucumbirmos ao que nossos pares chamam loucura 

E que ao invés disso 
Para tornar o fardo mais suportável
A natureza tenha criado em nós atalhos em forma de ficção que nos permitem exercer a natureza única do intelecto humano 
Sem ser paralisado e esmagado pela mistérios intrínsecos das coisas

Pra isso os papéis:
Homem, esposo, pai, cristão, democrata, capitalista. 
Tão seguros em sua mediocridade mas ao mesmo tempo servindo como vendas diante de uma luz que só poderia nos cegar. 

Como seria então dizer 
"Agora eu acredito" quero me colocar diante do Altar do Deus e consagrar a minha alma eterna a um compromisso sacro santo com a sua alma eterna. E depois de trabalhar pra pagar o financiamento da casa e do carro, criar nossos filhos dando a eles tudo de melhor; eu posso morrer como um homem respeitável, que cumpriu seu papel diante da sociedade e da natureza - e minha alma imortal seria recompensada eternamente na companhia de Jesus e de todos os homens sagrados num lugar que só pode ser o paraíso. Onde reencontraremos todas pessoas de que sentimos falta e teremos outra vez todas as oportunidades desperdiçadas de sermos felizes!!! 

Que ficção maravilhosa 
Que inveja eu tenho de vocês
Crentes 
Cegos 
Conformados
Medíocres 

Quem me condenou afinal a perceber que existe ali nesse arranjo do cérebro uma quantidade de reações químicas, eltricas, térmicas e etc. Capazes de portar, modificar e reproduzir informações, que formam nesse momento uma cadeia de linguagem capaz de navegar de um arranjo neuronal vertiginosamente complicado, através de pontos de luz numa tela touchscreen e através de ondas invisíveis percorrendo torres e satélites até alcançar as tuas retinas e através desses pixels transmitir a você uma informação que gere uma cadeia de reações químicas no seu corpo e REARRANJE o seu fucking cérebro??? 

Quem me condenou a perceber isso e pensar 
Caralho 
A realidade não é aquela versão simplificada que eles pregam nos pupitos, nos palanques, nos altares, nas salas de aula!!! 
O que está acontecendo aqui? 
O que eu sou? 
O que é o Universo??

Como essas pessoas poderiam passar despercebidas? 
Ou
Como poderiam lidar com a realidade se percebessem?? 

E isso tudo posto 
Eu olho para os gurus nas montanhas 
Afastados 
Tranquilos 
Distantes de todas as vaidades 
Realmente acima de todas as futilidades 
E em sua sabedoria melancólica
Proclamando como que a uma causa perdida:
A realidade é uma ilusão 
E eu penso na massa dos átomos e sua circunferência gigantesca composta de energia
E eu penso caralho 
A realidade é uma ilusão 
E porque eu estaria aqui então fazendo esse gigantesco exercício de vaidade, como se eu soubesse mais da realidade que qualquer outra pessoa? 
E como eu poderia me negar a fazer exatamente o que eu faço? 
Como eu poderia me considerar um indivíduo se mal tenho escolha? 
Como poderia me considerar um sábio se no meu exercício de convencimento eu hajo com vaidade e vontade de poder?? 

Não é fácil ser eu, mas eu não tenho escolha 
Eu sei que não é fácil ser você também, mas você não tem escolha 

No futuro quem sabe 
Em seu leito de morte 
Você talvez implore por mais alguns minutos
Obrigado por ter doado esses minutos pra mim 
Eu realmente espero que dê alguma forma esse texto te ajude a perceber que você não tem o leme ou as rédeas nas mãos 
E que na nossa ignorância e insignificância, consigamos cada vez mais abrir os olhos das nossas mentes para nossas possibilidades infinitas 
E que a percepção dessa complexidade atordoante seja de alguma forma divertida pra você. 

Foi muito difícil chegar até aqui 
O esforço de desenhar essa mandala em formato de texto é realmente intenso 
Vou fumar um cigarrinho contemplativo 🤣



sábado, 7 de novembro de 2020

poeirinha

Esse pedacinho de carne 
Que as vezes acha que é um eu
Não vai deixar nenhum legado
Mais duradouro que suas pegadas na praia

Mas esses átomos 
Esmagados no núcleo de estrelas 
E arranjados temporariamente
Em intrincada biologia 
Viveram e viram 
E experimentaram orgasmos 
E teceram mitologias inteiras 
E gargalharam
Ressonando no infinito

E quando talvez 
Uma entidade cósmica se debruçar 
Sobre esse pontinho ínfimo 
No oceano caudaloso do tempo 
Poderia se pudesse
Pensar 
Isso sim é uma vida

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Hoje eu lavei minha boca com vinho 
E sussurrei 
Na fumaça do cigarro 
Dizendo 
Eu te amo 
Eu te amo e isso não pode ser tomado levianamente 
Você deixa meu coração leve 
Você leva meu coração 
Me eleva 
Eu te amo de coração cheio 
Você é o vento fresco que bate no meu rosto 
Você é a paisagem linda em que eu me embriago
Você me enebria
Você me eleva 
Eu te amo 
E isso é lindo 
É bom 
E é puro 
O seu sorriso cristalino 
O brilho nos seus olhos 
Me levam daqui 
Pra um lugar 
Onde eu queria estar 
Um lugar onde somos felizes juntinhos 
Aonde somos parceiros 
Aonde você se abre pra mim 
E aonde somos um 
Somos parceiros 
E estamos juntos 
Esquecendo do mundo 
Eu quero que o vento me leve até você 
E que a brisa leve meu sussurro 
Dizendo 
Eu te amo 
Eu te amo pleno 
Você é minha plenitude