segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Não sou um homem fácil

Eu não sou um homem fácil
Nem quero ser
Eu que amo tanta gente
E não gosto de quase ninguém
Escolho a dedo quem eu converso
Mas eu não escolho é coisa nenhuma
Algumas coisas vão
E outras nunca serão

Eu já pensei muito
E eu já senti muito
E agora tenho em mim
Tudo isso condensado
Em vasta fauna de sentimentos

Eu fui formado pelas pressões tectônicas
Se sou duro, se brilho, se me estilhaço
E se eu decidi uma coisa
Não tem sermão que adiante
Mas eu não escolho é coisa nenhuma

O que decidi é só ser
Eu não conquisto
Eu não sou conquistado
Eu não me aturo
Mas acho uma sorte quem me tem ao seu lado

Eu que sou o menor dos homens
E superior à maioria deles
Prefiro mesmo
A minha própria companhia

Quando me dou eu sou um tesouro
Quando não me dou
Eu só não estou


Não quero machucar mais ninguém
Além de mim mesmo
Porque sendo assim tão natural
A gente percebe que não pode evitar
Ser quem se é
E se a sensibilidade me fez maduro
A maturidade me fez sensível

E sensível demais
Eu vou pensando e sentindo
E sendo
Eu mesmo me descubro
Enquanto vou acontecendo

Se eu pareço às vezes como um bicho
Ou se eu me comporto como fumaça
É porque eu sou essas duas coisas

Eu sou uma criança
Eu sou um ancião
Eu sou um lobo
E eu sou um bobo

Mas acontecendo eu vou me realizando
E não forço nada, sigo deslizando
Eu não vou pra onde o vento me leva
Escolho bem as minhas batalhas
Mas eu não escolho é nada
Brota de mim algo que eu também desconheço
E sobre coisas que os outros nem notam
Eu fico pensando, pensando

E se eu estou tão calado
É  que as palavras não bastam
Pra tempestade que arrebenta o meu peito

Se pareço louco
É porque eu desprezo a razão pequena
E dispenso a explicação reduzida
Se você precisa das palavras
Sinto muito
Eu não as possuo
Eu sou um poeta do silêncio
Um ilusionista apaixonado pela Verdade
Eu não tenho tempo para banalidade
A pequenez não me interessa
Eu busco mesmo
É minha própria transcendência

E assim eu vou sendo
Vou urrando, vou calando
Vou me debatendo
E vou evaporando
Até que minha história
Como tocha quente
Esteja consumada
E quando as cortinas da peça da minha vida se fecharem
Eu serei
O único na platéia
E antes que as luzes se apaguem
Eu quero estar aplaudindo de pé